10.9.10

Chile 11 de setembro de 1973




Maria Lucia tinha 25 anos e estava lá.
Queria construir com o povo chileno o tão sonhado mundo novo.
Seu sonho era o mesmo de muitas e muitas pessoas pelo mundo afora.

Em 1970, Salvador Allende foi eleito presidente do Chile e, como a lei mandava, teve sua eleição ratificada pelo Congresso.
Venceu o projeto da Unidade Popular que defendia uma sociedade com justiça e liberdade.
Era a chamada “Via chilena para o socialismo”, calcada na ordem democrática e na participação popular.
Em 1971, quando Maria Lucia chegou lá, encontrou um país em efervescência.
Os chilenos a receberam carinhosamente, como uma “hermana latinoamericana”.
Ela vinha do Brasil, pais das perseguições, da tortura...
Trazia o medo impregnado e a vontade de ser feliz!

Allende nacionalizou as minas de cobre (a principal riqueza do país), passou as minas de carvão e a telefonia para o controle do Estado, aumentou a intervenção nos bancos e fez a reforma agrária.
Para os latino-americanos pobres, ele era a própria esperança.
Para o governo dos americanos do norte, ele era uma ameaça.

No Chile, Maria Lucia soube o que era mobilização e organização popular de verdade.
Todos queriam contribuir para que um novo futuro se tornasse realidade.
E Maria Lucia vibrou, o povo tinha voz e sua voz era ouvida!
Estudante da Universidad de Concepción, sentia-se “fazendo parte”.
Fez muitos “compañeros” chilenos e de todas as partes do mundo.

Em março de 1973, nas eleições parlamentares, aumentou o apoio a Allende e à Unidade Popular.
Mas, crescia também a pressão contra o governo eleito e seu projeto socializante.
Os sindicatos patronais do transporte rodoviário faziam greves e fechavam estradas, causavam o desabastecimento nas médias e grandes cidades do país.
Havia boicote por todo lado e a classe média estava assustada.
A oposição golpista se organizava e crescia.
Allende estava indo longe demais e em 11 de setembro de 1973, venceu a estupidez.
E assim, acabou o respeito à lei, acabou a liberdade, a solidariedade, o futuro.
Acabou o sonho do mundo novo!
Hoje sabemos o quanto outros países e grandes multinacionais colaboraram, estratégica e financeiramente, para a vitória do golpe.

Maria Lucia foi levada para o Estádio Regional de Concepción. Não a acusavam de nada, mas a detiveram por ser brasileira, sinônimo de esquerdista.
Com centenas de pessoas, esteve presa na Quiriquina, uma ilha da Marinha.
Foi por pouco tempo, é verdade, somente por três dias, mas foi assustador.
Soube depois, que teve muita sorte em sair de lá.
Nunca estivera tão perto da morte.

Pinochet tomou o poder.
Milhares foram presos, torturados, mortos e desaparecidos por apoiar um governo eleito.
Milhares foram presos, torturados, mortos e desaparecidos por querer justiça social.
Milhares foram presos, torturados, mortos e desaparecidos por querer igualdade de oportunidades para todos.
Milhares foram presos, torturados, mortos e desaparecidos por querer o impossível?

E Maria Lucia nunca mais voltou a ser quem era.
Da maioria de seus amigos chilenos, nunca mais teve notícias.
Com o golpe a jovem tornou-se adulta e a tristeza do sonho desfeito jamais a abandonou.

8 comentários:

Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...

tia,
lindo relato.
só faltou dizer que as sementes daquele chile conseguiram germinar em outros solos...
bj,
enr

Maria Lucia disse...

é verdade, Querido! beijo

Anônimo disse...

Puxa, que história triste, mas linda.

Maria Lucia disse...

Depois deste 11 de setembro me tornei outra pessoa. Acho que um pouco melhor, rsrsrsrsrs

Anônimo disse...

Acho que todos os que sobrevvemos nos tornamos pessoas melhores. Foi uma obrigação em respeito aos que não tiveram a mesma sorte...
Um grande beijo da Vi(Virginia) , de Concepción também

Maria Lucia disse...

tens toda a razão!

Maria Lucia disse...

carinho e beijo, Virginia!