20.9.25
Sobre a Revolução Farroupilha I
Com a palavra Juremir Machado da Silva:
Até quando vamos endeusar a revolução farroupilha? Até
quando?
Sim, até quando teremos de mentir ou omitir para não
incomodar os poderosos individuais ou coletivos?
Até quando teremos que tapar o sol com a peneira para não
ferir as suscetibilidades dos que homenageiam anualmente uma “revolução” que
desconhecem?
Até quando teremos de aliviar as críticas para não ofender
os que, por não terem estudado História, acreditam que os farroupilhas foram
idealistas, abolicionistas e republicanos desde sempre?
Até quando teremos de fazer de conta que há dúvidas
consistentes sobre a terrível traição aos negros em Porongos?
Até quando teremos de justificar o horror com o argumento
simplório de que eram os valores da época? Valores da traição, do escravismo,
da infâmia?
Até quando fingiremos não saber que outros líderes – La
Fayette, Bolívar, Rivera – outros países – Uruguai, Argentina, Chile, Bolívia –
e outras rebeliões brasileiras – A Balaiada, no Maranhão, por exemplo – foram
mais progressistas e, contrariando “valores” da época, ousaram ir aonde os
farroupilhas não foram por impossibilidade ideológica?
Até quando a mídia terá de adular o conservadorismo e a
ignorância para fidelizar sua “audiência”?Até quando deixaremos de falar que
milhões de homens sempre souberam da infâmia da escravidão? Os escravos.
Até quando minimizaremos o fato de que a Farroupilha, com
seu lema de “liberdade, igualdade e humanidade”, vendeu negros para se
financiar?
Até quando deixaremos de enfatizar que os farrapos prometiam
liberdade aos negros dos adversários, mas não libertaram os seus?
Até quando daremos pouca importância ao fato de que a
Constituição farroupilha não previa a libertação dos escravos?
Até quando deixaremos de contar em todas as escolas que
Bento Gonçalves ao morrer, apenas dois anos depois do fim da guerra civil,
deixou mais de 50 escravos aos seus herdeiros?
Até quando? Até quando?
Até quando adularemos os admiradores de um passado que não
existiu somente porque as pessoas precisam de mitos e de razões para passar o
tempo, reunir-se e vibrar em comum?
Até quando os folcloristas sufocarão os historiadores?
Até quando o mito falará mais alto do que a História?
Até quando não se dirá nos jornais que os farroupilhas foram
indenizados pelo Império com verbas secretas? Que brigaram pelo dinheiro? Que
houve muita corrupção? Que Bento Gonçalves e Neto não eram republicanos quando
começaram a rebelião? Que houve degola, sequestros, apropriação de bens
alheios, execuções sumárias, saques, desvio de dinheiro, estupros, divisões
internas por causa de tudo isso e processos judiciais?
Até quando, em nome de uma mitologia da identidade, teremos
medo de desafiar os cultivadores da ilusão?
Até quando historiadores como Décio Freitas, Mário Maestri,
Sandra Pesavento, Tau Golin, Jorge Eusébio Assumpção, Spencer Leitman e tantos
outros serão marginalizados?
Até quando nossas crianças serão doutrinadas com cartilhas
contando só meias verdades?
Até quando a rebelião dos proprietários será apresentada
como uma revolução de todos?
Até quando mentiremos para nós mesmos?
Até quando precisaremos nos alimentar dessa ilusão?
Até quando viveremos assim?
Publicado em setembro de 2016, na Revista Afinal do Instituto Humanitas Unisinos.
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