Maria Lucia
tinha 25 anos e estava lá.
Queria
construir com o povo chileno o tão sonhado mundo novo.
Seu sonho
era o mesmo de muitas e muitas pessoas pelo mundo afora.
Em 1970,
Salvador Allende foi eleito presidente do Chile e, como a lei mandava, teve sua
eleição ratificada pelo Congresso.
Venceu o
projeto da Unidade Popular que defendia uma sociedade com justiça e liberdade.
Era a
chamada “Via chilena para o socialismo”, calcada na ordem democrática e na
participação popular.
Em 1971,
quando Maria Lucia chegou lá, encontrou um país em efervescência.
Os chilenos
a receberam carinhosamente, como uma “hermana latinoamericana”.
Ela vinha do
Brasil, pais das perseguições, da tortura...
Trazia o
medo impregnado e a vontade de ser feliz!
Allende
nacionalizou as minas de cobre (a principal riqueza do país), passou as minas
de carvão e a telefonia para o controle do Estado, aumentou a intervenção nos
bancos e fez a reforma agrária.
Para os
latino-americanos pobres, ele era a própria esperança.
Para o
governo dos americanos do norte, ele era uma ameaça.
No Chile,
Maria Lucia soube o que era mobilização e organização popular de verdade.
Todos
queriam contribuir para que um novo futuro se tornasse realidade.
E Maria
Lucia vibrou, o povo tinha voz e sua voz era ouvida!
Estudante da
Universidad de Concepción, sentia-se “fazendo parte”.
Fez muitos “compañeros”
chilenos e de todas as partes do mundo.
Em março de
1973, nas eleições parlamentares, aumentou o apoio a Allende e à Unidade
Popular.
Mas, crescia
também a pressão contra o governo eleito e seu projeto socializante.
Os
sindicatos patronais do transporte rodoviário faziam greves e fechavam
estradas, causavam o desabastecimento nas médias e grandes cidades do país.
Havia
boicote por todo lado e a classe média estava assustada.
A oposição
golpista se organizava e crescia.
Allende
estava indo longe demais e em 11 de setembro de 1973, venceu a estupidez.
E assim,
acabou o respeito à lei, acabou a liberdade, a solidariedade, o futuro.
Acabou o
sonho do mundo novo!
Hoje sabemos
o quanto outros países e grandes multinacionais colaboraram, estratégica e
financeiramente, para a vitória do golpe.
Maria Lucia
foi levada para o Estádio Regional de Concepción. Não a acusavam de nada, mas a
detiveram por ser brasileira, sinônimo de esquerdista.
Com centenas
de pessoas, esteve presa na Quiriquina, uma ilha da Marinha.
Foi por
pouco tempo, é verdade, somente por três dias, mas foi assustador.
Soube
depois, que teve muita sorte em sair de lá.
Nunca
estivera tão perto da morte.
Pinochet
tomou o poder.
Milhares
foram presos, torturados, mortos e desaparecidos por apoiar um governo eleito.
Milhares
foram presos, torturados, mortos e desaparecidos por querer justiça social.
Milhares
foram presos, torturados, mortos e desaparecidos por querer igualdade de
oportunidades para todos.
Milhares
foram presos, torturados, mortos e desaparecidos por querer o impossível?
E Maria
Lucia nunca mais voltou a ser quem era.
Da maioria
de seus amigos chilenos, nunca mais teve notícias.
Com o golpe
a jovem tornou-se adulta e a tristeza do sonho desfeito jamais a abandonou.
8 comentários:
tia,
lindo relato.
só faltou dizer que as sementes daquele chile conseguiram germinar em outros solos...
bj,
enr
é verdade, Querido! beijo
Puxa, que história triste, mas linda.
Depois deste 11 de setembro me tornei outra pessoa. Acho que um pouco melhor, rsrsrsrsrs
Acho que todos os que sobrevvemos nos tornamos pessoas melhores. Foi uma obrigação em respeito aos que não tiveram a mesma sorte...
Um grande beijo da Vi(Virginia) , de Concepción também
tens toda a razão!
carinho e beijo, Virginia!
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