14.4.21

Minhas primeiras "casas"

Quando nasci, minha família morava numa casa muito grande, na rua Riachuelo, em Porto Alegre. Na frente da casa, ficava um colégio de padres salesianos que, naquele tempo, usavam batinas pretas: o Colégio Nossa Senhora das Dores.

Meu pai, um anticlerical muito irreverente, me ensinou que tanto os padres quanto os guarda-chuvas se chamavam Bu. E eu, bem pequenininha e toda feliz, cada vez que via um deles, um padre ou um guarda-chuva, apontava e dizia: buuuuuuuuuu.

Era um sucesso: “tão engraçadinha”, rsrs. Mas, será que havia alguma semelhança com a palavra urubu?

Neste tempo, eu tinha dois amigos que moravam na casa ao lado da minha: o Luiz Artur e a Maninha. Ele, um pouco mais velho do que eu, estudava piano, o que me deixava morta de inveja.

Eu também queria tocar, mas minha mãe dizia que nunca teríamos condições financeiras para comprar um piano e por isto eu não podia aprender. E me obrigou a estudar balé, que eu odiava, porque eu tinha os “pés pra dentro”! Naquele tempo, ou se colocava botas ortopédicas (pretas e horrorosas),ou se estudava balé, ou ficava por isto mesmo. 

Nós três, brincávamos muito de teatro e a "peça" de que eu mais me lembro é história do Peter Pan. Hoje, tenho certeza de que nós voávamos de verdade, na sala, entre um sofá e outro, rumo à Terra do Nunca!A Maninha sempre era a Fada Sininho, eu era a Wendy e, claro, o Peter Pan era o Luiz Artur.

Eu era fascinada por este amigo. Quando ele estudou a Idade Média nas aulas de história, descobriu que os europeus daquela época não comiam açúcar. Resolveu fazer como eles e comer só mel. Tentei fazer o mesmo na minha casa, mas levei um corridão porque mel era muito caro, rsrs.

Os tios deles, que moravam na mesma casa, eram médicos e, por isto, havia muitas amostras de remédios na casa. Lembro da nossa alegria, abrindo as cápsulas coloridas e fazendo chuva com o "recheio" dos remédios da janela do segundo piso para o quintal.

 Quando eu tinha 9 anos, tivemos que nos mudar e fomos morar em um apartamento, no terceiro andar, bem menor do que a nossa casa e em outro bairro, Cidade Baixa. 

Foi uma adaptação triste e difícil. Perdi meus amigos, mas a perda mais triste foi a do Pinóquio, meu gatinho. Ele nunca chegou lá e a explicação que me deram para o seu "desaparecimento" nunca me convenceu.

Mas, houve ganhos também! A vista que se tinha das janelas abertas para o horizonte foi um deles. Se via muito céu e muitos morros! Uma noite, da janela da sala, assisti a uma maravilhosa tempestade de raios. Estavam tão longe que eu não conseguia ouvir nenhum barulho. Foi um espetáculo inesquecível

Do nosso apartamento, eu enxergava o quintal cheio de árvores onde sempre havia duas meninas brincando. Um belo dia, tomei coragem e puxei conversa: eu lá em cima, sentada no tanque, e elas lá embaixo. Eram a Elisabeth e a Paula e, logo, logo, estávamos brincando juntas naquele quintal. Não lembro delas na nossa casa, mas lembro bem das minhas idas à casa delas.

Gostava muito de estar lá! A mãe, Dona Cecília, fazia vestidos de noiva. O pai, Seu Paulo, era um artista gráfico e, depois descobrimos que era amigo do meu pai. O avô, era um velhinho bem velhinho, dono de uma tipografia, mas em outro lugar. O tio, pintor, morava em São Paulo e era só ouvirmos o barulho do motor de um avião e já estávamos abanando para o "Dindinho" que, pelo jeito, estava dentro de todos eles. A tia, Linda Gay, era uma famosa atriz de radionovelas, e isto me deixava muito exibida por conhecê-la pessoalmente. O cachorro era um cachorrão chamado Rex que, se bem me lembro, obedecia a poucas pessoas, entre elas, eu, rsrs

Da esquerda para a direita: Elisabeth, uma vizinha de quem não lembro o nome, Paula e eu.

Não lembro do que brincávamos, mas lembro muito bem da nossa alegria! 

Foi neste bairro que, adolescente, tive a minha primeira “turma”, mas aí é outra estória.

p.s 1- não perdi de vista a Maninha e o Luiz Artur porque ambos se dedicaram ao teatro e acompanho suas carreiras. Graças ao Facebook, reencontrei a Elisabeth e a Paula;

p.s 2- como devem ter notado, apartamento pra mim também é casa, rsrs


O edifício ainda está lá, mas um pouco maltratado. 
Morávamos no último andar, à direita.

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